Crítica

Crítica

Elvis: a biografia do rei sob os olhos do coronel

16/2/2023

Com uma estrutura típica de um filme biográfico, Elvis se diferencia pelo seu narrador, que conta a história de maneira conhecida, mas cuja natureza provoca um questionamento a mais no espectador.

escrito por
Luis Henrique Franco

Com uma estrutura típica de um filme biográfico, Elvis se diferencia pelo seu narrador, que conta a história de maneira conhecida, mas cuja natureza provoca um questionamento a mais no espectador.

escrito por
Luis Henrique Franco
16/2/2023

Elvis parece ser um daqueles filmes que comprovam que uma história contada por qualquer pessoa nunca apresenta os fatos em si, mas um ponto de vista sobre eles. Sem dúvidas o que mais diferencia essa biografia de tantas outras que o cinema produziu é a sua escolha por um narrador atípico, que compromete a narrativa no sentido de impedir que o espectador aceite tudo o que é mostrado sem muitas colheres de dúvida no caminho.

Isso porque, ao mesmo tempo em que acompanha a história do Rei do Rock, Elvis Presley (interpretado por Austin Butler), o filme é, na realidade, contado a partir do ponto de vista do Coronel Tom Parker (Tom Hanks), agente e empresário de Elvis que ficou conhecido pelas inúmeras falcatruas e golpes cometidos contra o cantor, sendo apontado por alguns como o verdadeiro causador da morte do ídolo. Com esse histórico, a escolha de Parker como narrador já se mostra ao espectador como algo estranho, e nossa confiança diminui ainda mais quando nos é revelada a natureza de Parker como um ilusionista, alguém acostumado a enganar sua audiência para conseguir o que quer.

Elvis e seus pais ao lado de Tom Parker enquanto assinam o contrato

É inacreditável o que essa mudança faz com um filme que, de outra maneira, seria uma biografia comum e sem nada de especial. Seguindo um formato conhecido, Elvis acompanha as vidas de Parker e de Presley a partir do momento em que ambos se conhecem pela primeira vez em uma apresentação menor em um parque de diversões. Desse ponto, conhecemos a origem humilde de Elvis e seu fascínio desde criança pela música negra, que exerceu uma poderosa influência sobre seus trabalhos, e então retomamos a narrativa do ponto em que ele e Parker firmam o seu acordo, que leva Elvis ao rápido estrelato.

O filme foca primordialmente na relação entre o cantor e seu empresário e segue rapidamente ao longo dos momentos mais importantes e marcantes da vida de ambos. Rápido e dinâmico, o roteiro não se permite gastar tempo desnecessário em determinado evento, focando neles o suficiente para sua adesão à história ser justificada e seu impacto no arco dos personagens ser mostrado. Por conta disso, Elvis não é um filme que cansa por se prender em momentos extra dramatizados para impacto e foca muito mais na carreira do cantor como um todo. Existem sim aspectos de sua vida pessoal que se destacam, como sua relação com os pais, seu amor por Priscila (Olivia DeJonge), seus problemas com despesas exageradas e sua luta para se manter à par dos acontecimentos do mundo. Mas o foco principal do longa é a relação e o conflito entre Elvis e Parker e a maneira como esse segundo dobrou as vontades do cantor para atender aos seus desejos, e como foi nas vezes em que Elvis o desafiou que sua carreira obteve seus melhores momentos.

O primeiro beijo de Elvis e Priscilla, enquanto o cantor servia na Alemanha.

Quando olhamos para o roteiro e a condução da história, porém, percebemos que, por mais interessante que tenha sido a vida de Elvis, a biografia conduzida por Baz Luhrmann não foge da fórmula do gênero. A atenção às músicas é marcante e a história é sólida, mas por si só não apresenta nada de especial... Até a entrada do narrador.

Sem esse aspecto, o filme não teria nada que realmente o destacasse, mas a escolha de Tom Parker como narrador realmente dá ao filme um trunfo especial. Nas biografias sobre cantores, sempre vemos os artistas serem vítimas de seus empresários, de uma forma que sempre ficamos ao lado deles e criamos em nossa mente a imagem do vilão do filme. Tom Parker não é diferente. O filme já começa relatando os abusos por ele cometidos e até o acusa de ter causado a morte de Elvis. E é essa pessoa, reconhecidamente o antagonista da história, quem narra os fatos, dando a cada elemento do filme um ar de desconfiança pelo fato de que não vemos uma interpretação pela visão do protagonista, mas sim do homem que devemos torcer contra. O tempo todo nos questionamos: como Parker está distorcendo esse acontecimento? Isso realmente ocorreu dessa forma? O que ele está omitindo?

Elvis Presleyse apresenta para o público.

Mas mesmo com o controle da narrativa nas mãos de Parker, o filme toma cuidado para não perdoá-lo ou justificá-lo. Suas desculpas sempre são recebidas com suspeitas, e suas justificativas sempre vão de encontro ao que é mostrado, ressaltando muito mais o comportamento de Elvis e mantendo o seu destaque muito maior do que Parker ao longo de todo o filme. É um trabalho difícil o de criar uma narrativa de forma que o espectador seja forçado a desconfiar do narrador e tirar suas próprias conclusões a partir do que está vendo. Um trabalho certamente facilitado pelas atuações brilhantes de Hanks e Butler, que constroem imagens poderosas de seus personagens e estabelecem entre si uma relação forte e convincente e que se adapta bem ao andamento do filme. Tom Hanks proporciona o espetáculo de sempre e traz a sua bagagem e experiência consigo, mas Austin Butler é quem rouba o show, apresentando um Elvis charmoso, carismático e envolvente que rapidamente conquista o público.

Elvis visita um velho clube onde um amigo toca.

Elvis é um filme sobre a construção da imagem. A escolha de Parker como narrador ressalta isso: é uma admissão de que tudo ali é construído. E ao fazer isso, reflete sobre como Elvis Presley é também uma imagem construída, uma ilusão criada pelas roubas, o cabelo, o gingado e as músicas que escondiam quem ele realmente era e quem ele queria ser. É uma reflexão importante, e seu uso é o que impede o filme de cair como uma biografia normal sobre outra estrela da música do passado.

EXPECTATIVAS PARA O OSCAR

Prêmios Indicados: Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Fotografia, Melhor Edição, Melhor Cabelo e Maquiagem, Melhor Figurino, Melhor Design de Produção, Melhor Som.

Não é segredo nenhum que uma biografia de um ídolo da música chegue ao Oscar com alguma força. E Elvis certamente possui seu valor para figurar nas indicações recebidas. Com uma força muito maior em categorias técnicas, e sem estar indicado nem a Direção e nem a Roteiro, este parece ser o indicado mais fraco para Melhor Filme até agora. E talvez seja justificável. Por melhor que tenha sido seu desempenho, é uma biografia muito normal, salvo pela escolha de narrador, que não muda muito como o filme é construído, apenas nossa interpretação do mesmo. Uma vez que nos acostumamos a isso, porém, o filme não chega a ser surpreendente, e suas conquistas são pequenas diante de outros indicados.

Fotografia e Edição são outras categorias em que o filme não deve ter muito destaque. Embora boas, não são nem de longe as mais impressionantes entre os Indicados, e certamente não são os fatores mais chamativos dos mesmos. Design de Produção até recebe uma tratativa melhor, conseguindo ambientar bem os palcos e a época em que Elvis vivia, mas também é uma construção bem conhecida pela Academia, no seu esforço de retratar fielmente uma época não muito distante. Certamente possui méritos, mas não é o melhor entre os Indicados. Som é outra categoria que tem um destaque maior, com toda a tenção à música e ao seu uso, edição e mixagem dentro das cenas. Os sucessos de Elvis tocam o tempo todo, não só nos momentos em que o personagem canta, e criam uma boa atmosfera para cada cena. Sem dúvida é uma das categorias em que o filme tem mais chances.

Considerando a vida do artista retratado, não é mistério que Maquiagem e Cabelo e Figurino sejam alguns aspectos onde o filme realmente brilha. As roupas usadas por Elvis em seus shows são retratadas com bastante fidelidade, e existe um trabalho bastante dedicado na criação dos icônicos penteados do cantor, além de uma grande atenção aos estilos da época. A própria maquiagem usada em Tom Hanks é digna de nota, tornando-o quase irreconhecível à primeira vista.

Tom Hanks sob a maquiagem que o transformou no Coronel Parker.

E então chegamos ao Melhor Ator. Austin Butler realmente deu a interpretação da sua vida. Ainda extremamente jovem, o ator conseguiu desempenhar um papel formidável como o cantor, retratando-o não só como a imagem que todos viam no palco, mas também em seus conflitos pessoais que o público nunca via, seus dramas familiares e seus desejos não realizados. É uma atuação bastante forte, e surpreendente para um ator até então desconhecido, e Butler sustenta o papel com primor. A competição deve ser árdua devido às demais grandes atuações demonstradas, com destaque especial para a performance de Brendan Fraser em A Baleia, mas tendo vencido o Globo de Ouro, Butler já se solidifica como um provável favorito ao prêmio.

Austin Butler como Elvis Presley

No geral, Elvis se destaca como a biografia principal dessa edição do Oscar. E, como toda biografia indicada, traz o seu sucesso e demonstra uma força para conseguir indicações em várias categorias. Mas é um gênero já muito batido, e que apresentou poucas mudanças e novidades ao longo do ano. Sua força está sempre nas categorias de atuação, mas fora a indicação de Butler, o filme não parece ser um grande favorito em muitos outros lugares.

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Elvis

Elvis

Direção: 
Criação:
Roteirista 1
Roteirista 2
Roteirista 3
Diretor 1
Diretor 2
Diretor 3
Elenco Principal:
Ator 1
Ator 2
Ator 3
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Com uma estrutura típica de um filme biográfico, Elvis se diferencia pelo seu narrador, que conta a história de maneira conhecida, mas cuja natureza provoca um questionamento a mais no espectador.

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Luis Henrique Franco
16/2/2023

Elvis parece ser um daqueles filmes que comprovam que uma história contada por qualquer pessoa nunca apresenta os fatos em si, mas um ponto de vista sobre eles. Sem dúvidas o que mais diferencia essa biografia de tantas outras que o cinema produziu é a sua escolha por um narrador atípico, que compromete a narrativa no sentido de impedir que o espectador aceite tudo o que é mostrado sem muitas colheres de dúvida no caminho.

Isso porque, ao mesmo tempo em que acompanha a história do Rei do Rock, Elvis Presley (interpretado por Austin Butler), o filme é, na realidade, contado a partir do ponto de vista do Coronel Tom Parker (Tom Hanks), agente e empresário de Elvis que ficou conhecido pelas inúmeras falcatruas e golpes cometidos contra o cantor, sendo apontado por alguns como o verdadeiro causador da morte do ídolo. Com esse histórico, a escolha de Parker como narrador já se mostra ao espectador como algo estranho, e nossa confiança diminui ainda mais quando nos é revelada a natureza de Parker como um ilusionista, alguém acostumado a enganar sua audiência para conseguir o que quer.

Elvis e seus pais ao lado de Tom Parker enquanto assinam o contrato

É inacreditável o que essa mudança faz com um filme que, de outra maneira, seria uma biografia comum e sem nada de especial. Seguindo um formato conhecido, Elvis acompanha as vidas de Parker e de Presley a partir do momento em que ambos se conhecem pela primeira vez em uma apresentação menor em um parque de diversões. Desse ponto, conhecemos a origem humilde de Elvis e seu fascínio desde criança pela música negra, que exerceu uma poderosa influência sobre seus trabalhos, e então retomamos a narrativa do ponto em que ele e Parker firmam o seu acordo, que leva Elvis ao rápido estrelato.

O filme foca primordialmente na relação entre o cantor e seu empresário e segue rapidamente ao longo dos momentos mais importantes e marcantes da vida de ambos. Rápido e dinâmico, o roteiro não se permite gastar tempo desnecessário em determinado evento, focando neles o suficiente para sua adesão à história ser justificada e seu impacto no arco dos personagens ser mostrado. Por conta disso, Elvis não é um filme que cansa por se prender em momentos extra dramatizados para impacto e foca muito mais na carreira do cantor como um todo. Existem sim aspectos de sua vida pessoal que se destacam, como sua relação com os pais, seu amor por Priscila (Olivia DeJonge), seus problemas com despesas exageradas e sua luta para se manter à par dos acontecimentos do mundo. Mas o foco principal do longa é a relação e o conflito entre Elvis e Parker e a maneira como esse segundo dobrou as vontades do cantor para atender aos seus desejos, e como foi nas vezes em que Elvis o desafiou que sua carreira obteve seus melhores momentos.

O primeiro beijo de Elvis e Priscilla, enquanto o cantor servia na Alemanha.

Quando olhamos para o roteiro e a condução da história, porém, percebemos que, por mais interessante que tenha sido a vida de Elvis, a biografia conduzida por Baz Luhrmann não foge da fórmula do gênero. A atenção às músicas é marcante e a história é sólida, mas por si só não apresenta nada de especial... Até a entrada do narrador.

Sem esse aspecto, o filme não teria nada que realmente o destacasse, mas a escolha de Tom Parker como narrador realmente dá ao filme um trunfo especial. Nas biografias sobre cantores, sempre vemos os artistas serem vítimas de seus empresários, de uma forma que sempre ficamos ao lado deles e criamos em nossa mente a imagem do vilão do filme. Tom Parker não é diferente. O filme já começa relatando os abusos por ele cometidos e até o acusa de ter causado a morte de Elvis. E é essa pessoa, reconhecidamente o antagonista da história, quem narra os fatos, dando a cada elemento do filme um ar de desconfiança pelo fato de que não vemos uma interpretação pela visão do protagonista, mas sim do homem que devemos torcer contra. O tempo todo nos questionamos: como Parker está distorcendo esse acontecimento? Isso realmente ocorreu dessa forma? O que ele está omitindo?

Elvis Presleyse apresenta para o público.

Mas mesmo com o controle da narrativa nas mãos de Parker, o filme toma cuidado para não perdoá-lo ou justificá-lo. Suas desculpas sempre são recebidas com suspeitas, e suas justificativas sempre vão de encontro ao que é mostrado, ressaltando muito mais o comportamento de Elvis e mantendo o seu destaque muito maior do que Parker ao longo de todo o filme. É um trabalho difícil o de criar uma narrativa de forma que o espectador seja forçado a desconfiar do narrador e tirar suas próprias conclusões a partir do que está vendo. Um trabalho certamente facilitado pelas atuações brilhantes de Hanks e Butler, que constroem imagens poderosas de seus personagens e estabelecem entre si uma relação forte e convincente e que se adapta bem ao andamento do filme. Tom Hanks proporciona o espetáculo de sempre e traz a sua bagagem e experiência consigo, mas Austin Butler é quem rouba o show, apresentando um Elvis charmoso, carismático e envolvente que rapidamente conquista o público.

Elvis visita um velho clube onde um amigo toca.

Elvis é um filme sobre a construção da imagem. A escolha de Parker como narrador ressalta isso: é uma admissão de que tudo ali é construído. E ao fazer isso, reflete sobre como Elvis Presley é também uma imagem construída, uma ilusão criada pelas roubas, o cabelo, o gingado e as músicas que escondiam quem ele realmente era e quem ele queria ser. É uma reflexão importante, e seu uso é o que impede o filme de cair como uma biografia normal sobre outra estrela da música do passado.

EXPECTATIVAS PARA O OSCAR

Prêmios Indicados: Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Fotografia, Melhor Edição, Melhor Cabelo e Maquiagem, Melhor Figurino, Melhor Design de Produção, Melhor Som.

Não é segredo nenhum que uma biografia de um ídolo da música chegue ao Oscar com alguma força. E Elvis certamente possui seu valor para figurar nas indicações recebidas. Com uma força muito maior em categorias técnicas, e sem estar indicado nem a Direção e nem a Roteiro, este parece ser o indicado mais fraco para Melhor Filme até agora. E talvez seja justificável. Por melhor que tenha sido seu desempenho, é uma biografia muito normal, salvo pela escolha de narrador, que não muda muito como o filme é construído, apenas nossa interpretação do mesmo. Uma vez que nos acostumamos a isso, porém, o filme não chega a ser surpreendente, e suas conquistas são pequenas diante de outros indicados.

Fotografia e Edição são outras categorias em que o filme não deve ter muito destaque. Embora boas, não são nem de longe as mais impressionantes entre os Indicados, e certamente não são os fatores mais chamativos dos mesmos. Design de Produção até recebe uma tratativa melhor, conseguindo ambientar bem os palcos e a época em que Elvis vivia, mas também é uma construção bem conhecida pela Academia, no seu esforço de retratar fielmente uma época não muito distante. Certamente possui méritos, mas não é o melhor entre os Indicados. Som é outra categoria que tem um destaque maior, com toda a tenção à música e ao seu uso, edição e mixagem dentro das cenas. Os sucessos de Elvis tocam o tempo todo, não só nos momentos em que o personagem canta, e criam uma boa atmosfera para cada cena. Sem dúvida é uma das categorias em que o filme tem mais chances.

Considerando a vida do artista retratado, não é mistério que Maquiagem e Cabelo e Figurino sejam alguns aspectos onde o filme realmente brilha. As roupas usadas por Elvis em seus shows são retratadas com bastante fidelidade, e existe um trabalho bastante dedicado na criação dos icônicos penteados do cantor, além de uma grande atenção aos estilos da época. A própria maquiagem usada em Tom Hanks é digna de nota, tornando-o quase irreconhecível à primeira vista.

Tom Hanks sob a maquiagem que o transformou no Coronel Parker.

E então chegamos ao Melhor Ator. Austin Butler realmente deu a interpretação da sua vida. Ainda extremamente jovem, o ator conseguiu desempenhar um papel formidável como o cantor, retratando-o não só como a imagem que todos viam no palco, mas também em seus conflitos pessoais que o público nunca via, seus dramas familiares e seus desejos não realizados. É uma atuação bastante forte, e surpreendente para um ator até então desconhecido, e Butler sustenta o papel com primor. A competição deve ser árdua devido às demais grandes atuações demonstradas, com destaque especial para a performance de Brendan Fraser em A Baleia, mas tendo vencido o Globo de Ouro, Butler já se solidifica como um provável favorito ao prêmio.

Austin Butler como Elvis Presley

No geral, Elvis se destaca como a biografia principal dessa edição do Oscar. E, como toda biografia indicada, traz o seu sucesso e demonstra uma força para conseguir indicações em várias categorias. Mas é um gênero já muito batido, e que apresentou poucas mudanças e novidades ao longo do ano. Sua força está sempre nas categorias de atuação, mas fora a indicação de Butler, o filme não parece ser um grande favorito em muitos outros lugares.

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Crítica

Com uma estrutura típica de um filme biográfico, Elvis se diferencia pelo seu narrador, que conta a história de maneira conhecida, mas cuja natureza provoca um questionamento a mais no espectador.

escrito por
Luis Henrique Franco
16/2/2023
nascimento

Com uma estrutura típica de um filme biográfico, Elvis se diferencia pelo seu narrador, que conta a história de maneira conhecida, mas cuja natureza provoca um questionamento a mais no espectador.

escrito por
Luis Henrique Franco
16/2/2023

Elvis parece ser um daqueles filmes que comprovam que uma história contada por qualquer pessoa nunca apresenta os fatos em si, mas um ponto de vista sobre eles. Sem dúvidas o que mais diferencia essa biografia de tantas outras que o cinema produziu é a sua escolha por um narrador atípico, que compromete a narrativa no sentido de impedir que o espectador aceite tudo o que é mostrado sem muitas colheres de dúvida no caminho.

Isso porque, ao mesmo tempo em que acompanha a história do Rei do Rock, Elvis Presley (interpretado por Austin Butler), o filme é, na realidade, contado a partir do ponto de vista do Coronel Tom Parker (Tom Hanks), agente e empresário de Elvis que ficou conhecido pelas inúmeras falcatruas e golpes cometidos contra o cantor, sendo apontado por alguns como o verdadeiro causador da morte do ídolo. Com esse histórico, a escolha de Parker como narrador já se mostra ao espectador como algo estranho, e nossa confiança diminui ainda mais quando nos é revelada a natureza de Parker como um ilusionista, alguém acostumado a enganar sua audiência para conseguir o que quer.

Elvis e seus pais ao lado de Tom Parker enquanto assinam o contrato

É inacreditável o que essa mudança faz com um filme que, de outra maneira, seria uma biografia comum e sem nada de especial. Seguindo um formato conhecido, Elvis acompanha as vidas de Parker e de Presley a partir do momento em que ambos se conhecem pela primeira vez em uma apresentação menor em um parque de diversões. Desse ponto, conhecemos a origem humilde de Elvis e seu fascínio desde criança pela música negra, que exerceu uma poderosa influência sobre seus trabalhos, e então retomamos a narrativa do ponto em que ele e Parker firmam o seu acordo, que leva Elvis ao rápido estrelato.

O filme foca primordialmente na relação entre o cantor e seu empresário e segue rapidamente ao longo dos momentos mais importantes e marcantes da vida de ambos. Rápido e dinâmico, o roteiro não se permite gastar tempo desnecessário em determinado evento, focando neles o suficiente para sua adesão à história ser justificada e seu impacto no arco dos personagens ser mostrado. Por conta disso, Elvis não é um filme que cansa por se prender em momentos extra dramatizados para impacto e foca muito mais na carreira do cantor como um todo. Existem sim aspectos de sua vida pessoal que se destacam, como sua relação com os pais, seu amor por Priscila (Olivia DeJonge), seus problemas com despesas exageradas e sua luta para se manter à par dos acontecimentos do mundo. Mas o foco principal do longa é a relação e o conflito entre Elvis e Parker e a maneira como esse segundo dobrou as vontades do cantor para atender aos seus desejos, e como foi nas vezes em que Elvis o desafiou que sua carreira obteve seus melhores momentos.

O primeiro beijo de Elvis e Priscilla, enquanto o cantor servia na Alemanha.

Quando olhamos para o roteiro e a condução da história, porém, percebemos que, por mais interessante que tenha sido a vida de Elvis, a biografia conduzida por Baz Luhrmann não foge da fórmula do gênero. A atenção às músicas é marcante e a história é sólida, mas por si só não apresenta nada de especial... Até a entrada do narrador.

Sem esse aspecto, o filme não teria nada que realmente o destacasse, mas a escolha de Tom Parker como narrador realmente dá ao filme um trunfo especial. Nas biografias sobre cantores, sempre vemos os artistas serem vítimas de seus empresários, de uma forma que sempre ficamos ao lado deles e criamos em nossa mente a imagem do vilão do filme. Tom Parker não é diferente. O filme já começa relatando os abusos por ele cometidos e até o acusa de ter causado a morte de Elvis. E é essa pessoa, reconhecidamente o antagonista da história, quem narra os fatos, dando a cada elemento do filme um ar de desconfiança pelo fato de que não vemos uma interpretação pela visão do protagonista, mas sim do homem que devemos torcer contra. O tempo todo nos questionamos: como Parker está distorcendo esse acontecimento? Isso realmente ocorreu dessa forma? O que ele está omitindo?

Elvis Presleyse apresenta para o público.

Mas mesmo com o controle da narrativa nas mãos de Parker, o filme toma cuidado para não perdoá-lo ou justificá-lo. Suas desculpas sempre são recebidas com suspeitas, e suas justificativas sempre vão de encontro ao que é mostrado, ressaltando muito mais o comportamento de Elvis e mantendo o seu destaque muito maior do que Parker ao longo de todo o filme. É um trabalho difícil o de criar uma narrativa de forma que o espectador seja forçado a desconfiar do narrador e tirar suas próprias conclusões a partir do que está vendo. Um trabalho certamente facilitado pelas atuações brilhantes de Hanks e Butler, que constroem imagens poderosas de seus personagens e estabelecem entre si uma relação forte e convincente e que se adapta bem ao andamento do filme. Tom Hanks proporciona o espetáculo de sempre e traz a sua bagagem e experiência consigo, mas Austin Butler é quem rouba o show, apresentando um Elvis charmoso, carismático e envolvente que rapidamente conquista o público.

Elvis visita um velho clube onde um amigo toca.

Elvis é um filme sobre a construção da imagem. A escolha de Parker como narrador ressalta isso: é uma admissão de que tudo ali é construído. E ao fazer isso, reflete sobre como Elvis Presley é também uma imagem construída, uma ilusão criada pelas roubas, o cabelo, o gingado e as músicas que escondiam quem ele realmente era e quem ele queria ser. É uma reflexão importante, e seu uso é o que impede o filme de cair como uma biografia normal sobre outra estrela da música do passado.

EXPECTATIVAS PARA O OSCAR

Prêmios Indicados: Melhor Filme, Melhor Ator, Melhor Fotografia, Melhor Edição, Melhor Cabelo e Maquiagem, Melhor Figurino, Melhor Design de Produção, Melhor Som.

Não é segredo nenhum que uma biografia de um ídolo da música chegue ao Oscar com alguma força. E Elvis certamente possui seu valor para figurar nas indicações recebidas. Com uma força muito maior em categorias técnicas, e sem estar indicado nem a Direção e nem a Roteiro, este parece ser o indicado mais fraco para Melhor Filme até agora. E talvez seja justificável. Por melhor que tenha sido seu desempenho, é uma biografia muito normal, salvo pela escolha de narrador, que não muda muito como o filme é construído, apenas nossa interpretação do mesmo. Uma vez que nos acostumamos a isso, porém, o filme não chega a ser surpreendente, e suas conquistas são pequenas diante de outros indicados.

Fotografia e Edição são outras categorias em que o filme não deve ter muito destaque. Embora boas, não são nem de longe as mais impressionantes entre os Indicados, e certamente não são os fatores mais chamativos dos mesmos. Design de Produção até recebe uma tratativa melhor, conseguindo ambientar bem os palcos e a época em que Elvis vivia, mas também é uma construção bem conhecida pela Academia, no seu esforço de retratar fielmente uma época não muito distante. Certamente possui méritos, mas não é o melhor entre os Indicados. Som é outra categoria que tem um destaque maior, com toda a tenção à música e ao seu uso, edição e mixagem dentro das cenas. Os sucessos de Elvis tocam o tempo todo, não só nos momentos em que o personagem canta, e criam uma boa atmosfera para cada cena. Sem dúvida é uma das categorias em que o filme tem mais chances.

Considerando a vida do artista retratado, não é mistério que Maquiagem e Cabelo e Figurino sejam alguns aspectos onde o filme realmente brilha. As roupas usadas por Elvis em seus shows são retratadas com bastante fidelidade, e existe um trabalho bastante dedicado na criação dos icônicos penteados do cantor, além de uma grande atenção aos estilos da época. A própria maquiagem usada em Tom Hanks é digna de nota, tornando-o quase irreconhecível à primeira vista.

Tom Hanks sob a maquiagem que o transformou no Coronel Parker.

E então chegamos ao Melhor Ator. Austin Butler realmente deu a interpretação da sua vida. Ainda extremamente jovem, o ator conseguiu desempenhar um papel formidável como o cantor, retratando-o não só como a imagem que todos viam no palco, mas também em seus conflitos pessoais que o público nunca via, seus dramas familiares e seus desejos não realizados. É uma atuação bastante forte, e surpreendente para um ator até então desconhecido, e Butler sustenta o papel com primor. A competição deve ser árdua devido às demais grandes atuações demonstradas, com destaque especial para a performance de Brendan Fraser em A Baleia, mas tendo vencido o Globo de Ouro, Butler já se solidifica como um provável favorito ao prêmio.

Austin Butler como Elvis Presley

No geral, Elvis se destaca como a biografia principal dessa edição do Oscar. E, como toda biografia indicada, traz o seu sucesso e demonstra uma força para conseguir indicações em várias categorias. Mas é um gênero já muito batido, e que apresentou poucas mudanças e novidades ao longo do ano. Sua força está sempre nas categorias de atuação, mas fora a indicação de Butler, o filme não parece ser um grande favorito em muitos outros lugares.

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