Crítica

Crítica

Gato de Botas 2: como tirar o máximo de algo simples

20/2/2023

Mesmo com uma narrativa já conhecida, Gato de Botas 2 cria uma aventura divertida e entusiasmante que se destaca por seus personagens carismáticos e bem desenvolvidos.

escrito por
Luis Henrique Franco

Mesmo com uma narrativa já conhecida, Gato de Botas 2 cria uma aventura divertida e entusiasmante que se destaca por seus personagens carismáticos e bem desenvolvidos.

escrito por
Luis Henrique Franco
20/2/2023

Depois que o primeiro Gato de Botas se mostrou uma animação mediana e sem nada de especial, não sendo nem capaz de adicionar algo de relevância ao universo de Shrek, é compreensível que o público não olhe com bons olhos a perspectiva de uma continuação. Dito isso, Gato de Botas 2: O Último Desejo é infinitamente melhor que o primeiro, conseguindo construir uma aventura realmente entusiasmante e divertida para o seu público. Mas o mais surpreendente sobre esse filme é que suas conquistas não vieram pelo fato de que seus criadores criaram uma gigantesca inovação na animação, mas sim souberam como trabalhar elementos já conhecidos.

Falo isso porque, se analisarmos em um primeiro contexto, a história de Gato de Botas 2 não é muito especial no papel. Depois de viver oito vidas desregradas e sem o menor cuidado, o herói felino (dublado por Antonio Banderas) encontra-se na última de suas nova vidas e caçado por um lobo feroz (Wagner Moura) que deseja acabar com ele de vez. Para impedir isso, o Gato se une à sua velha aliada Kitty Patamansa (Salma Hayek) e ao excêntrico Perrito (Harvey Guillén) para encontrar o lendário Último desejo, uma estrela cadente que pode conceder a qualquer um que a encontrar qualquer desejo, podendo, assim, restaurar as vidas perdidas do Gato. Basicamente, é a fórmula de um filme de aventura: mocinhos se unem para encontrar um tesouro antigo, passam por desafios no caminho, se desentendem, são perseguidos por outros caçadores do mesmo tesouro, etc.

O herói Gato de Botas saca sua espada para enfrentar um inimigo

O que se destaca nesse filme, porém, não é a sua história, mas como ela explora os personagens e os aprofunda de maneira que poucos filmes do gênero conseguem. reconhecendo que sua história não é uma aventura original e inovadora, Gato de Botas 2 opta por investir um tempo maior ao desenvolvimento de seus personagens, seus conflitos, suas relações e seus propósitos, permitindo ao público se conectar ainda mais com eles. Desconstruindo estereótipos do gênero, o longa preenche sua trama com momentos bastante íntimos que desafiam nossa percepção sobre os personagens que julgamos conhecer. Começando pelo próprio Gato, temos um herói que tenta manter a postura de protagonista arrogante e destemido, mas é constantemente confrontado por dúvidas internas e um pânico imobilizante, conforme ele reconhece que desperdiçou suas vidas e se convence ainda mais da necessidade de ter suas chances de volta.

O filme explora com precisão tremenda a fragilidade de seu protagonista, permitindo que ele seja sabotado por seus sentimentos e seu desejo de ser um herói novamente e reconhecendo as falhas que ele cometeu no passado. A partir dessas falhas, o roteiro inicia um processo de reconstrução do personagem, permitindo que sua última vida seja um verdadeiro recomeço para o seu "eu" e para a reparação de seus erros. Assim, mais do que apenas um herói arrogante, o Gato se torna um personagem em evolução, permitindo que o público se conecte com seu processo de evolução e simpatize mais com sua jornada através do reconhecimento de suas fragilidades.

E esse processo de reconstrução não se limita ao protagonista. Praticamente todos os personagens do filme sofrem uma reconstrução ao longo da história, que dedica tempo para explorar suas motivações e questões internas de forma a solidificar a posição de cada um na chegada ao clímax. Kitty recebe um aprofundamento interessante de sua jornada e Perrito é desenvolvido o bastante para assumir uma posição importante no desenvolvimento da trama, conseguindo ser um personagem divertido e engraçado sem cair no papel de um simples alívio cômico. Mas o filme não faz isso apenas com seus protagonistas, mas também com seus vilões.

Gato, Kitty e Perrito se aventuram por um cenário misterioso

Gato de Botas 2 consegue introduzir em sua história relativamente simples três grupos de vilões, o que poderia ser um grande erro. O filme, contudo, consegue dar a seus antagonistas tempo suficiente para se desenvolverem em personagens carismáticos e com motivações bem explícitas e trabalhadas. Mesmo que nem todos sejam completamente humanizados e compreendidos, ainda assim lhes dão uma complexidade que os torna interessante e faz com que o tempo dedicado a acompanhar a sua jornada seja revigorante. A principal vilã a receber esse tratamento é Cachinhos Dourados (Florence Pugh), cuja relação com sua família de ursos constitui uma trama e um conflito interessante e que a torna tão simpática quanto o Gato de Botas. Já Joãozão Trombeta (John Mulaney), mesmo que não tenha o tratamento que o torne humanizado e compreensível, recebe atenção o suficiente para se tornar um grande antagonista, e extremamente divertido de se assistir.

Cachinhos Dourados procura o Último Desejo ao lado de sua família de ursos

Contudo, o maior destaque vai para o Lobo. Mesmo que seu tempo de tela seja menor que os outros vilões, o personagem possui uma presença tão poderosa que é sentida a todo momento e influencia a história mesmo quando ele não se encontra presente. Com um certo humor ácido e uma ferocidade cruel, o Lobo se torna mais do que um adversário notório. Ele constitui uma séria ameaça, que chega a ser realmente assustador e alterar o próprio tom mais leve que o filme realmente traz.

O Lobo Mau encara o Gato de Botas com um olhar feroz.

Favorecendo seus personagens, Gato de Botas 2 contorna a simplicidade de sua história e extrai o máximo do que poderia ser mais um filme comum de aventura animada. Em vez disso, o que recebemos é uma poderosa jornada focada nos personagens e que consegue penetrar profundamente no âmago de seus protagonistas, fornecendo não só uma aventura divertida, mas uma história realmente profunda e reflexiva para públicos tanto adultos quanto juvenis.

EXPECTATIVAS PARA O OSCAR

Prêmios Indicados: Melhor Animação

Gato de Botas 2 não chama a atenção só pela sua história focada nos personagens, mas também por sua animação. Seus traços se assemelham a um desenho pintado, perdendo um pouco o efeito de animação computadorizada e fornecendo ao filme um visual único que, em alguns momentos, parece ser menos preenchido por detalhes, mas que não deixa de ser uma imagem sempre bela de se assistir.

Mas mesmo dessa simplicidade de traços o longa consegue tirar vantagem. A presença de menos detalhes fornece uma facilidade para a movimentação, e Gato de Botas 2 se aproveita disso para tornar sua animação dinâmica e permitir uma criatividade muito maior de movimentos. Assim, os movimentos dos personagens conseguem ser rápidos, favorecendo as cenas de ação que preenchem o filme e permitindo que os animadores desfrutem de uma oportunidade única para demonstrar enorme criatividade. E a falta de detalhes não significa que a animação não possua sua riqueza. As expressões dos personagens são criadas de forma fantástica, explorando um certo exagero cartunesco, e os cenários são criados para transmitir um ar de fantasia bem-vindo a um mundo de conto de fadas. As cenas de ação são fluidas e desfrutam da ausência de alguns frames que as torna mais frenéticas e excitantes.

Gato e Ktty conversam em meio a um rio encantado.

Até no domínio de sua própria mídia, Gato de Botas 2 demonstra sua enorme capacidade de tirar o máximo de algo que poderia ser visto como simples. É nessa simplicidade, contudo, que mora a força da animação, capaz de trabalhar todos os aspectos que possui a seu favor de maneira exemplar, e de uma forma que talvez não fosse possível se o desenho demonstrasse mais detalhes em sua composição. Competindo contra o favorito Pinóquio de Guillermo del Toro, é difícil dizer que o longa da Dreamworks consiga levar o prêmio. Ainda assim, Gato de Botas já se mostra como um grande favorito, desbancando o resto da concorrência e estabelecendo um duelo pessoal com o stop-motion de del Toro pelo prêmio.

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Gato de Botas 2: O Último Desejo

Gato de Botas 2: O Último Desejo

Direção: 
Criação:
Roteirista 1
Roteirista 2
Roteirista 3
Diretor 1
Diretor 2
Diretor 3
Elenco Principal:
Ator 1
Ator 2
Ator 3
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Mesmo com uma narrativa já conhecida, Gato de Botas 2 cria uma aventura divertida e entusiasmante que se destaca por seus personagens carismáticos e bem desenvolvidos.

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Luis Henrique Franco
20/2/2023

Depois que o primeiro Gato de Botas se mostrou uma animação mediana e sem nada de especial, não sendo nem capaz de adicionar algo de relevância ao universo de Shrek, é compreensível que o público não olhe com bons olhos a perspectiva de uma continuação. Dito isso, Gato de Botas 2: O Último Desejo é infinitamente melhor que o primeiro, conseguindo construir uma aventura realmente entusiasmante e divertida para o seu público. Mas o mais surpreendente sobre esse filme é que suas conquistas não vieram pelo fato de que seus criadores criaram uma gigantesca inovação na animação, mas sim souberam como trabalhar elementos já conhecidos.

Falo isso porque, se analisarmos em um primeiro contexto, a história de Gato de Botas 2 não é muito especial no papel. Depois de viver oito vidas desregradas e sem o menor cuidado, o herói felino (dublado por Antonio Banderas) encontra-se na última de suas nova vidas e caçado por um lobo feroz (Wagner Moura) que deseja acabar com ele de vez. Para impedir isso, o Gato se une à sua velha aliada Kitty Patamansa (Salma Hayek) e ao excêntrico Perrito (Harvey Guillén) para encontrar o lendário Último desejo, uma estrela cadente que pode conceder a qualquer um que a encontrar qualquer desejo, podendo, assim, restaurar as vidas perdidas do Gato. Basicamente, é a fórmula de um filme de aventura: mocinhos se unem para encontrar um tesouro antigo, passam por desafios no caminho, se desentendem, são perseguidos por outros caçadores do mesmo tesouro, etc.

O herói Gato de Botas saca sua espada para enfrentar um inimigo

O que se destaca nesse filme, porém, não é a sua história, mas como ela explora os personagens e os aprofunda de maneira que poucos filmes do gênero conseguem. reconhecendo que sua história não é uma aventura original e inovadora, Gato de Botas 2 opta por investir um tempo maior ao desenvolvimento de seus personagens, seus conflitos, suas relações e seus propósitos, permitindo ao público se conectar ainda mais com eles. Desconstruindo estereótipos do gênero, o longa preenche sua trama com momentos bastante íntimos que desafiam nossa percepção sobre os personagens que julgamos conhecer. Começando pelo próprio Gato, temos um herói que tenta manter a postura de protagonista arrogante e destemido, mas é constantemente confrontado por dúvidas internas e um pânico imobilizante, conforme ele reconhece que desperdiçou suas vidas e se convence ainda mais da necessidade de ter suas chances de volta.

O filme explora com precisão tremenda a fragilidade de seu protagonista, permitindo que ele seja sabotado por seus sentimentos e seu desejo de ser um herói novamente e reconhecendo as falhas que ele cometeu no passado. A partir dessas falhas, o roteiro inicia um processo de reconstrução do personagem, permitindo que sua última vida seja um verdadeiro recomeço para o seu "eu" e para a reparação de seus erros. Assim, mais do que apenas um herói arrogante, o Gato se torna um personagem em evolução, permitindo que o público se conecte com seu processo de evolução e simpatize mais com sua jornada através do reconhecimento de suas fragilidades.

E esse processo de reconstrução não se limita ao protagonista. Praticamente todos os personagens do filme sofrem uma reconstrução ao longo da história, que dedica tempo para explorar suas motivações e questões internas de forma a solidificar a posição de cada um na chegada ao clímax. Kitty recebe um aprofundamento interessante de sua jornada e Perrito é desenvolvido o bastante para assumir uma posição importante no desenvolvimento da trama, conseguindo ser um personagem divertido e engraçado sem cair no papel de um simples alívio cômico. Mas o filme não faz isso apenas com seus protagonistas, mas também com seus vilões.

Gato, Kitty e Perrito se aventuram por um cenário misterioso

Gato de Botas 2 consegue introduzir em sua história relativamente simples três grupos de vilões, o que poderia ser um grande erro. O filme, contudo, consegue dar a seus antagonistas tempo suficiente para se desenvolverem em personagens carismáticos e com motivações bem explícitas e trabalhadas. Mesmo que nem todos sejam completamente humanizados e compreendidos, ainda assim lhes dão uma complexidade que os torna interessante e faz com que o tempo dedicado a acompanhar a sua jornada seja revigorante. A principal vilã a receber esse tratamento é Cachinhos Dourados (Florence Pugh), cuja relação com sua família de ursos constitui uma trama e um conflito interessante e que a torna tão simpática quanto o Gato de Botas. Já Joãozão Trombeta (John Mulaney), mesmo que não tenha o tratamento que o torne humanizado e compreensível, recebe atenção o suficiente para se tornar um grande antagonista, e extremamente divertido de se assistir.

Cachinhos Dourados procura o Último Desejo ao lado de sua família de ursos

Contudo, o maior destaque vai para o Lobo. Mesmo que seu tempo de tela seja menor que os outros vilões, o personagem possui uma presença tão poderosa que é sentida a todo momento e influencia a história mesmo quando ele não se encontra presente. Com um certo humor ácido e uma ferocidade cruel, o Lobo se torna mais do que um adversário notório. Ele constitui uma séria ameaça, que chega a ser realmente assustador e alterar o próprio tom mais leve que o filme realmente traz.

O Lobo Mau encara o Gato de Botas com um olhar feroz.

Favorecendo seus personagens, Gato de Botas 2 contorna a simplicidade de sua história e extrai o máximo do que poderia ser mais um filme comum de aventura animada. Em vez disso, o que recebemos é uma poderosa jornada focada nos personagens e que consegue penetrar profundamente no âmago de seus protagonistas, fornecendo não só uma aventura divertida, mas uma história realmente profunda e reflexiva para públicos tanto adultos quanto juvenis.

EXPECTATIVAS PARA O OSCAR

Prêmios Indicados: Melhor Animação

Gato de Botas 2 não chama a atenção só pela sua história focada nos personagens, mas também por sua animação. Seus traços se assemelham a um desenho pintado, perdendo um pouco o efeito de animação computadorizada e fornecendo ao filme um visual único que, em alguns momentos, parece ser menos preenchido por detalhes, mas que não deixa de ser uma imagem sempre bela de se assistir.

Mas mesmo dessa simplicidade de traços o longa consegue tirar vantagem. A presença de menos detalhes fornece uma facilidade para a movimentação, e Gato de Botas 2 se aproveita disso para tornar sua animação dinâmica e permitir uma criatividade muito maior de movimentos. Assim, os movimentos dos personagens conseguem ser rápidos, favorecendo as cenas de ação que preenchem o filme e permitindo que os animadores desfrutem de uma oportunidade única para demonstrar enorme criatividade. E a falta de detalhes não significa que a animação não possua sua riqueza. As expressões dos personagens são criadas de forma fantástica, explorando um certo exagero cartunesco, e os cenários são criados para transmitir um ar de fantasia bem-vindo a um mundo de conto de fadas. As cenas de ação são fluidas e desfrutam da ausência de alguns frames que as torna mais frenéticas e excitantes.

Gato e Ktty conversam em meio a um rio encantado.

Até no domínio de sua própria mídia, Gato de Botas 2 demonstra sua enorme capacidade de tirar o máximo de algo que poderia ser visto como simples. É nessa simplicidade, contudo, que mora a força da animação, capaz de trabalhar todos os aspectos que possui a seu favor de maneira exemplar, e de uma forma que talvez não fosse possível se o desenho demonstrasse mais detalhes em sua composição. Competindo contra o favorito Pinóquio de Guillermo del Toro, é difícil dizer que o longa da Dreamworks consiga levar o prêmio. Ainda assim, Gato de Botas já se mostra como um grande favorito, desbancando o resto da concorrência e estabelecendo um duelo pessoal com o stop-motion de del Toro pelo prêmio.

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Mesmo com uma narrativa já conhecida, Gato de Botas 2 cria uma aventura divertida e entusiasmante que se destaca por seus personagens carismáticos e bem desenvolvidos.

escrito por
Luis Henrique Franco
20/2/2023
nascimento

Mesmo com uma narrativa já conhecida, Gato de Botas 2 cria uma aventura divertida e entusiasmante que se destaca por seus personagens carismáticos e bem desenvolvidos.

escrito por
Luis Henrique Franco
20/2/2023

Depois que o primeiro Gato de Botas se mostrou uma animação mediana e sem nada de especial, não sendo nem capaz de adicionar algo de relevância ao universo de Shrek, é compreensível que o público não olhe com bons olhos a perspectiva de uma continuação. Dito isso, Gato de Botas 2: O Último Desejo é infinitamente melhor que o primeiro, conseguindo construir uma aventura realmente entusiasmante e divertida para o seu público. Mas o mais surpreendente sobre esse filme é que suas conquistas não vieram pelo fato de que seus criadores criaram uma gigantesca inovação na animação, mas sim souberam como trabalhar elementos já conhecidos.

Falo isso porque, se analisarmos em um primeiro contexto, a história de Gato de Botas 2 não é muito especial no papel. Depois de viver oito vidas desregradas e sem o menor cuidado, o herói felino (dublado por Antonio Banderas) encontra-se na última de suas nova vidas e caçado por um lobo feroz (Wagner Moura) que deseja acabar com ele de vez. Para impedir isso, o Gato se une à sua velha aliada Kitty Patamansa (Salma Hayek) e ao excêntrico Perrito (Harvey Guillén) para encontrar o lendário Último desejo, uma estrela cadente que pode conceder a qualquer um que a encontrar qualquer desejo, podendo, assim, restaurar as vidas perdidas do Gato. Basicamente, é a fórmula de um filme de aventura: mocinhos se unem para encontrar um tesouro antigo, passam por desafios no caminho, se desentendem, são perseguidos por outros caçadores do mesmo tesouro, etc.

O herói Gato de Botas saca sua espada para enfrentar um inimigo

O que se destaca nesse filme, porém, não é a sua história, mas como ela explora os personagens e os aprofunda de maneira que poucos filmes do gênero conseguem. reconhecendo que sua história não é uma aventura original e inovadora, Gato de Botas 2 opta por investir um tempo maior ao desenvolvimento de seus personagens, seus conflitos, suas relações e seus propósitos, permitindo ao público se conectar ainda mais com eles. Desconstruindo estereótipos do gênero, o longa preenche sua trama com momentos bastante íntimos que desafiam nossa percepção sobre os personagens que julgamos conhecer. Começando pelo próprio Gato, temos um herói que tenta manter a postura de protagonista arrogante e destemido, mas é constantemente confrontado por dúvidas internas e um pânico imobilizante, conforme ele reconhece que desperdiçou suas vidas e se convence ainda mais da necessidade de ter suas chances de volta.

O filme explora com precisão tremenda a fragilidade de seu protagonista, permitindo que ele seja sabotado por seus sentimentos e seu desejo de ser um herói novamente e reconhecendo as falhas que ele cometeu no passado. A partir dessas falhas, o roteiro inicia um processo de reconstrução do personagem, permitindo que sua última vida seja um verdadeiro recomeço para o seu "eu" e para a reparação de seus erros. Assim, mais do que apenas um herói arrogante, o Gato se torna um personagem em evolução, permitindo que o público se conecte com seu processo de evolução e simpatize mais com sua jornada através do reconhecimento de suas fragilidades.

E esse processo de reconstrução não se limita ao protagonista. Praticamente todos os personagens do filme sofrem uma reconstrução ao longo da história, que dedica tempo para explorar suas motivações e questões internas de forma a solidificar a posição de cada um na chegada ao clímax. Kitty recebe um aprofundamento interessante de sua jornada e Perrito é desenvolvido o bastante para assumir uma posição importante no desenvolvimento da trama, conseguindo ser um personagem divertido e engraçado sem cair no papel de um simples alívio cômico. Mas o filme não faz isso apenas com seus protagonistas, mas também com seus vilões.

Gato, Kitty e Perrito se aventuram por um cenário misterioso

Gato de Botas 2 consegue introduzir em sua história relativamente simples três grupos de vilões, o que poderia ser um grande erro. O filme, contudo, consegue dar a seus antagonistas tempo suficiente para se desenvolverem em personagens carismáticos e com motivações bem explícitas e trabalhadas. Mesmo que nem todos sejam completamente humanizados e compreendidos, ainda assim lhes dão uma complexidade que os torna interessante e faz com que o tempo dedicado a acompanhar a sua jornada seja revigorante. A principal vilã a receber esse tratamento é Cachinhos Dourados (Florence Pugh), cuja relação com sua família de ursos constitui uma trama e um conflito interessante e que a torna tão simpática quanto o Gato de Botas. Já Joãozão Trombeta (John Mulaney), mesmo que não tenha o tratamento que o torne humanizado e compreensível, recebe atenção o suficiente para se tornar um grande antagonista, e extremamente divertido de se assistir.

Cachinhos Dourados procura o Último Desejo ao lado de sua família de ursos

Contudo, o maior destaque vai para o Lobo. Mesmo que seu tempo de tela seja menor que os outros vilões, o personagem possui uma presença tão poderosa que é sentida a todo momento e influencia a história mesmo quando ele não se encontra presente. Com um certo humor ácido e uma ferocidade cruel, o Lobo se torna mais do que um adversário notório. Ele constitui uma séria ameaça, que chega a ser realmente assustador e alterar o próprio tom mais leve que o filme realmente traz.

O Lobo Mau encara o Gato de Botas com um olhar feroz.

Favorecendo seus personagens, Gato de Botas 2 contorna a simplicidade de sua história e extrai o máximo do que poderia ser mais um filme comum de aventura animada. Em vez disso, o que recebemos é uma poderosa jornada focada nos personagens e que consegue penetrar profundamente no âmago de seus protagonistas, fornecendo não só uma aventura divertida, mas uma história realmente profunda e reflexiva para públicos tanto adultos quanto juvenis.

EXPECTATIVAS PARA O OSCAR

Prêmios Indicados: Melhor Animação

Gato de Botas 2 não chama a atenção só pela sua história focada nos personagens, mas também por sua animação. Seus traços se assemelham a um desenho pintado, perdendo um pouco o efeito de animação computadorizada e fornecendo ao filme um visual único que, em alguns momentos, parece ser menos preenchido por detalhes, mas que não deixa de ser uma imagem sempre bela de se assistir.

Mas mesmo dessa simplicidade de traços o longa consegue tirar vantagem. A presença de menos detalhes fornece uma facilidade para a movimentação, e Gato de Botas 2 se aproveita disso para tornar sua animação dinâmica e permitir uma criatividade muito maior de movimentos. Assim, os movimentos dos personagens conseguem ser rápidos, favorecendo as cenas de ação que preenchem o filme e permitindo que os animadores desfrutem de uma oportunidade única para demonstrar enorme criatividade. E a falta de detalhes não significa que a animação não possua sua riqueza. As expressões dos personagens são criadas de forma fantástica, explorando um certo exagero cartunesco, e os cenários são criados para transmitir um ar de fantasia bem-vindo a um mundo de conto de fadas. As cenas de ação são fluidas e desfrutam da ausência de alguns frames que as torna mais frenéticas e excitantes.

Gato e Ktty conversam em meio a um rio encantado.

Até no domínio de sua própria mídia, Gato de Botas 2 demonstra sua enorme capacidade de tirar o máximo de algo que poderia ser visto como simples. É nessa simplicidade, contudo, que mora a força da animação, capaz de trabalhar todos os aspectos que possui a seu favor de maneira exemplar, e de uma forma que talvez não fosse possível se o desenho demonstrasse mais detalhes em sua composição. Competindo contra o favorito Pinóquio de Guillermo del Toro, é difícil dizer que o longa da Dreamworks consiga levar o prêmio. Ainda assim, Gato de Botas já se mostra como um grande favorito, desbancando o resto da concorrência e estabelecendo um duelo pessoal com o stop-motion de del Toro pelo prêmio.

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